quarta-feira, 10 de março de 2010

Partido Verde




“O preço que os homens de bem pagam pelo seu desinteresse da política é a qualidade dos políticos.” - Platão


A cada eleição via uma oportunidade de colocar em debate as causas socioambientais, pois é sempre uma boa hora, numa democracia, para se rever posições e escolhas e promover mudanças. A questão ambiental é prioritária, pois sem um Planeta capaz de suportar a vida, de nada vai adiantar toda a riqueza e toda a democracia ou justiça social do mundo! Assegurar a preservação do Planeta não é causa para um ou outro partido político, mas para todos, e também inclusive para quem não é ligado a partido algum.

Muitos dos problemas socioambientais que conhecemos têm origem em legislações e ações do poder público, ou podem ser solucionados por eles. Como eleitor e ambientalista, sentia-me convocado a votar melhor, a escolher candidatos comprometidos com o interesse público, e não com os interesses privados, comprometidos com as causas das liberdades democráticas, a preservação ambiental e a maior justiça social.

Os maus políticos e maus administradores, os corruptos, não chegam sozinhos ao poder, mas são colocados – e mantidos - lá pelo voto desinteressado, ou dos que se omitem, ou dos que não ‘querem saber’ de política, ou dos que trocam o seu voto por uma vantagem pessoal qualquer. E só existem dois caminhos para mudar isso, ou pela força de uma revolução - mas aí, quem iria tirar as armas dos revolucionários depois que chegassem ao poder? – ou pelo voto consciente e responsável. Escolhi este segundo caminho.

No início, comecei procurando pelos partidos políticos e a participar de debates políticos, por que sempre defendi que para votar consciente tínhamos que conhecer direito em que estávamos votando, e não apenas procurar saber disso no dia das eleições. Procurava por um representante político que tivesse idéias iguais ou melhores que as minhas.

Comecei uma campanha sistemática junto à sociedade pelo voto consciente e responsável. Preparei uma relação de perguntas e enviei por carta a alguns potenciais candidatos, alguns responderam, outros não. Passei a considerar apenas os que responderam, por que se o candidato quer manter o distanciamento dos eleitores agora, quando está em campanha, imagine depois de eleito!

Em minha carta falava de preocupações sócio-ambientais com a cidade ou bairro e fazia perguntas específicas sobre como o candidato se propunha a dar solução ou a encaminhar as questões, uma vez eleito.

Também fazia contato com a coordenação de campanha dos candidatos que me responderam para saber sobre a agenda do candidato, onde eu poderia estar presente para ouvi-lo discursar. Passei a comparecer a comícios e debates com candidatos e sempre que podia fazia perguntas e colocava o tema ambiental em debates, lembrando ao candidato que minha presença ali não significava nenhum compromisso eleitoral nem meu nem das pessoas que me acompanhavam. Assim, através deste contato direto, passei a conhecer melhor os candidatos de minha cidade. Muitos deles completamente vazios, só palavreado bonito e, às vezes, nem isso. E nesses, eu já sabia que não devia votar.

Também me preocupava em saber sobre o partido do candidato, se ele teria força para lutar pelas idéias que defendia, pois nenhum político, por melhor que seja, faz nada sozinho. Claro, isso não significava que devia votar em alguém só pelo partido do candidato, se fosse de minha preferência, pois para mim o mais importante eram as idéias e a cabeça do próprio candidato. Entretanto, o prefeito precisa de maioria na Câmara. Os vereadores precisam de maioria para aprovar seus projetos. Maioria é uma conquista que depende de capacidade de convencimento, articulação e diálogo com quem pensa e tem interesses diferentes dos nossos. Se o candidato não conseguisse demonstrar essa habilidade, ficaria isolado e pouco poderia fazer ao chegar ao Poder. Por isso, achava importante questionar o candidato sobre seus compromissos éticos, até onde estaria disposto a ir para conseguir adesões. E como fazer propaganda custa caro, eu também questionava sobre a origem dos recursos que financiava a campanha do candidato. De onde vinha todo o dinheiro para as despesas? Que tipo de acordo ou negócio o candidato poderia estar fazendo para ganhar a eleição? Estaria se comprometendo com interesses privados que o afastarão depois de eleito do interesse público?

Tinha a preocupação de ser autêntico e votava pela minha cabeça e não pela cabeça dos outros. Meu voto iria para um candidato da oposição, se eu achasse que as coisas estavam erradas e precisavam mudar, e que os políticos e administradores que estavam no poder não eram capazes de promover as mudanças necessárias. E também votaria num candidato da base de apoio ao governo, se achasse que o poder deveria continuar nas mesmas mãos.

Quando o candidato que escolhi já detinha um mandato, tinha o cuidado de examinar não apenas os projetos que apresentou, mas se ele se empenhou para que estes projetos fossem cumpridos. Há políticos que apresentam bons projetos, mas que não sabem ou não se interessam em lutar para tirá-los do papel. Então, eu estudava o histórico dos votos e apoios do candidato e comparava como votou em votações estratégicas para o meio ambiente da cidade, que emendas apresentou ao orçamento. Durante essas votações, buscava saber se o meu potencial candidato esteve presente ou ausente, se omitiu ou votou em favor de bons projetos e contra os maus!

Entre as demandas mínimas que apresentava aos candidatos incluía-se a promoção de ciclovias para transporte interligadas a meios de transporte de massa e coletivos como trem, metrô, ônibus, bonde – baratos ou gratuitos como alternativa aos engarrafamentos e à poluição provocados nas cidades e zonas rurais pelo carro individual e pelo sistema dos transportes rodoviários; a defesa da saúde pública contra a poluição do ar, da água; a redução do tempo de trabalho como resposta ao desemprego e como visão da sociedade que privilegia o tempo livre em relação a acumulação de bens; a substituição da energia baseada na queima de combustíveis fósseis pela energia flexível que trabalha com os ciclos do sol, da água e do vento; agricultura de regeneração que reabastece o solo e incorpora meios naturais de controle das pragas; fim da devastação das fontes de recursos naturais (renováveis e não-renováveis); parada do envenenamento da biosfera pelo descarregamento de lixo tóxico; drástico controle da poluição do ar efetuada pelas indústrias e meios de transporte e redução dos "níveis aceitáveis" de exposição radioativa, entre outras reivindicações.

Comecei a freqüentar a Assembléias Populares, na Cidade do Rio de Janeiro, na Escola Senador Correa, que reuniam de 50 a 200 pessoas para debater sobre os problemas socioambientais da Cidade, reunindo pessoas de todas as tendências e correntes de pensamentos. Deste caldeirão democrático nasceu a APEDEMA – Assembléia Permanente de Entidades de Defesa do Meio Ambiente, que ajudei a fundar. Já sabia que a questão ambiental podia e era abordada por diferentes ângulos, mas ali, naquelas assembléias, estes diferentes ângulos ganharam rostos, vozes, conflitos. Foi, para mim, uma escola de democracia e de aprimoramento do pensamento ecológico! Nos confrontos das idéias divergentes, aprimorei meu próprio pensamento ecológico. Os debates se dividiam em correntes de pensamento, seguindo análise de Eduardo Viola, onde sobressaíam os ‘pragmáticos’.

Além da maioria de pragmáticos, haviam também os ‘ecologistas fundamentalistas’ que tendiam a considerar os ‘ecocapitalistas’ e ‘ecossocialistas’ como um tanto estranhos ao movimento ecológico e potencialmente deturpadores da pureza do movimento. Os ‘ecocapitalistas’ e ‘ecossocialistas’ que, por sua vez, tendiam a desconsiderar os ‘fundamentalistas’ pelo seu caráter romântico e politicamente ingênuo, embora reconhecessem a dedicação ao movimento por parte daqueles. Os ‘ecossocialistas’ que desconfiavam das reais e potenciais vinculações com a burguesia por parte dos ‘ecocapitalistas’ e tendiam a criticar, em bloco, a ‘tecnoburocracia ecocapitalista’ das agências estatais do meio ambiente. Os ‘ecocapitalistas’, por sua vez, desconfiavam dos objetivos dos ‘ecossocialistas’ e temiam que “aparelhassem” o movimento ecológico para transformá-lo num apêndice dos partidos de esquerda.

Desse ‘caldeirão cultural’, surgiu também o Partido Verde, do qual fui um dos fundadores junto com algumas figuras de longa presença no movimento ecológico brasileiro como o Fernando Gabeira, Liszt Vieira e Carlos Minc. Acabei me envolvendo nas campanhas dos três, cada um em épocas diferentes. Primeiro, ajudei na campanha do Liszt, a deputado estadual pelo PT, para depois me dedicar a eleger o Minc, ainda um professor universitário que se lançava candidato pela primeira vez a Deputado Estadual e que acabou se elegendo e reelegendo várias vezes, e chegou a ser Ministro do Meio Ambiente no segundo Governo Lula. Também me envolvi diretamente na coordenação da Campanha do Gabeira ao Governo do Estado do Rio de Janeiro, pela coligação PT/PV, com destaque para o grande abraço ecológico à Lagoa Rodrigo de Freitas, em 1994.

Aceitei a missão de ser candidato a vereador pelo PV, em São Gonçalo, cidade onde eu morava e onde havia fundado a UNIVERDE, pois o Partido recém-fundado precisava divulgar seu ideário e atrair eleitores. Compreendi a importância de minha candidatura para o Partido e vi também como uma oportunidade de fazer educação ambiental junto à população.

“Vilmar tem sido um dos pilares de sustentação das questões ambientais / sociais do estado do Rio de Janeiro nos últimos 10 anos. Para mim, o convívio e o debate de inúmeras questões que afligem a sociedade e a natureza do Rio de Janeiro, ao longo dos anos com o Vilmar, têm sido sempre um contínuo aprendizado e desenvolvimento de novas soluções técnicas, econômicas, mesmo políticas na busca do tão almejado desenvolvimento sustentável. A Educação Ambiental, visando a informação e o desenvolvimento da cidadania do verde tem sido seu principal instrumento e objetivo como ambientalista. Inúmeras são as suas contribuições nesta área. Neste sentido, Vilmar, sem dúvida é uma referência na questões ambientais no estado do Rio de Janeiro.” - PROF. David Zee, UERJ


Foi muito importante como cidadão ter passado pela experiência de ser candidato, pois me permitiu circular pela cidade e falar sobre meio ambiente e a importância de sua preservação para a nossa qualidade de vida em muitos lugares onde de outra forma não seria possível. Apesar de sermos livres para irmos aonde quisermos, na prática, acabamos freqüentando e indo aos mesmos lugares a vida toda, como nichos urbanos dentro de nossas cidades. E, quando se é candidato, aceitamos convites para palestras e vamos a outros ‘nichos’, circulando por toda a cidade. Então, ser candidato me permitiu subir morros, ir a favelas, palestrei em escolas e associações de moradores, sindicatos, clubes, igrejas, onde tive de traduzir o ecologês às carências da população, falei com gente de todas as classes sociais, circulei pela cidade como jamais imaginaria que poderia fazer! Como canta Milton Nascimento, fui onde o “povo está”! Ser candidato ampliou minha visão de mundo e também o espaço que ocupava na cidade. Fui questionado – e questionei-me - em minha ética, meu discurso, minha visão de mundo e do povo, minha linguagem, minha postura. Saí da eleição mais maduro e rico de momentos e experiências, de conhecer gentes, lugares, visões de mundo diferentes! Saí mais brasileiro e com mais vontade de ajudar nosso povo a superar suas limitações e as condições de miséria, social, econômica e cultural em que vivia!

"Você não pode ensinar nada a um homem; você pode apenas ajudá-lo a encontrar a resposta dentro dele mesmo." - Galileu Galilei


Entretanto, apesar de saber sobre as carências de nossa sociedade, estar com as pessoas mais carentes em seu próprio ambiente foi uma experiência que me marcou profundamente. Uma coisa é você saber da realidade, outra coisa é você encará-la de frente, como eu tive de fazer quando fui candidato. Deparei-me com uma carência profunda em nosso povo, muito maior que apenas econômica, mas principalmente cultural e cidadã. Nas comunidades de baixa renda falei para um tipo de público de gente trabalhadora, humilde, e descrente com os políticos e a política, uma gente acostumada a não ter seus direitos de cidadania respeitados, a maioria analfabetos funcionais, que apesar de saberem ler e escrever tinham dificuldade para apreender as idéias de um texto, e dificuldade maior ainda para perceberem as entrelinhas, o que um texto não dizia quando tentava dizer! Então, me dispus a mostrar o quanto um meio ambiente preservado era fundamental para assegurar a qualidade de vida de todos, que um meio ambiente ecologicamente equilibrado era um direito de todos e que também era um dever de todos lutarem e reivindicarem sua preservação para as presentes e futuras gerações, de acordo com as capacidades e responsabilidade de cada um! Lia para eles e mostrava as entrelinhas, ajudava na interpretação dos textos, na identificação das idéias nos panfletos políticos, para que o povo pudesse cobrar mais tarde de seus representantes as promessas que escreveram e mandaram distribuir à população! Também explicava sobre o papel de um vereador, o que podia e não podia fazer, que tinha de fazer boas leis e fiscalizar o Poder Executivo e, este sim, é quem teria de fazer as obras, abrir concurso público para empregos, assegurar vagas nas escolas e leitos nos hospitais!

Ao término do meu discurso, quando já me despedia, era comum ser cercado no ‘cantinho’, ao me dirigir ou entrar no carro, por alguns moradores e lideranças com pedidos legítimos de metros de cano para trazer a água potável até suas casas, empregos de merendeiras e faxineiras em colégios ou postos de saúde, vagas na escola municipal para seus filhos, camisetas para o time de futebol, etc. Eu ficava com a sensação de que não tinham ouvido uma única palavra do que eu havia dito e só esperavam a hora em que eu iria parar de falar para que pudessem me pedir alguma coisa. A descrença nos políticos e na política chegava a tal ponto que parecia que estávamos num jogo de gato e rato! O candidato fingia que ao ser eleito iria cuidar do interesse público e não de seus interesses privados ou dos interesses do seu partido, e o povo que o escutava fingia que acreditava. E, quando acabava a brincadeirinha, então o povo queria saber o que o candidato estaria disposto a dar aqui e agora pelo voto do eleitor, quanto seria pago pela boca de urna, por que sabia que, uma vez eleito, nunca mais veriam o candidato novamente. Assim, o voto era trocado por sacos de cimento, camisetas para o time de futebol, promessas de emprego e vagas na escola ou posto de saúde, ou por qualquer outra vantagem objetiva. Descrentes da política, as pessoas não acreditavam mais que tivessem chance a terem seus direitos de cidadãos respeitados, e contentavam-se com alguma vantagem ou privilégio aqui e agora!

Nestes momentos, ouvia com atenção e compreensão, pois sabia das carências econômica, cultural e de cidadania de nosso povo sofrido, mas educadamente não fazia concessões, e reforçava a explicação sobre o real papel de um vereador, fazer leis e fiscalizar leis, e que não estava ao seu alcance distribuir vantagens e privilégios e que ficassem atentos a candidatos que prometessem tais coisas, pois não iriam cumprir mesmo! Também alertava sobre a necessidade do eleitor mudar de atitude e passar a reivindicar direitos e não vantagens e privilégios, pois ao agir assim, atraia um tipo de candidato que também está interessado em vantagens e privilégios, e não no interesse público! Claro, não me elegi. Na verdade, nem mesmo o meu voto apareceu na urna! E tenho certeza de que votei em mim e portando, pelo menos meu voto teria que aparecer na urna!

Então compreendi por que políticas de ‘pão e circo’ ainda faziam tanto sucesso e o quanto nossa sociedade ainda teria de lutar e avançar para se chamar de democrática! E decidi a não me candidatar novamente, não por que tenha deixado de acreditar na democracia representativa, mas por que percebi que eu seria mais útil à sociedade atuando na educação e comunicação ambiental e na construção e fortalecimento da sociedade civil e do movimento ecológico.

“A política é a mais nobre atividade de um ser humano, por ser a virtude e a prática do bem comum.” - Aristóteles


O PDT de Brizola ganhou a eleição para a Prefeitura de São Gonçalo (RJ), em 1986, tendo como candidato a Prefeito o engenheiro da Petrobrás, e deputado estadual, Edson Ezequiel, numa coligação com outros partidos entre os quais o Partido Verde. Fui indicado pelo meu partido para assumir a pasta Ambiental no governo Ezequiel. Em princípio, pensei em não aceitar, pois não me sentia à altura do cargo e preferia permanecer no movimento ecológico, cobrando por políticas públicas ambientais, mas fui convencido pela insistência dos companheiros de partido a assumir. Aceitei como desafio pessoal e profissional.

Ao assumir funções públicas, imediatamente comuniquei à UNIVERDE que não poderia continuar representando a organização e renunciei ao cargo de presidente. Para minha frustração, vi a UNIVERDE enfraquecer-se a ponto de em poucos meses estar correndo o risco de acabar e aquilo me preocupava muito, pois contava com um movimento ecológico atuante e que cobrasse bastante da Prefeitura por que aí eu teria força, internamente, para dar encaminhamento à pauta ambiental.

Até que um dia recebi na Prefeitura um líder comunitário muito indignado cobrando de mim por que a Prefeitura ainda não tinha tirado a lixeira de dentro do manguezal! Enquanto ele falava, em vez de ficar chateado, em vez de tentar questionar onde estava ele quando durante anos lutei contra aquela lixeira, fiquei pensando que ótimo presidente seria para a UNIVERDE! Era o Roberto Félix, na época, garçom de profissão e atuando na Associação de Moradores do Boassu. Então, após dar razão ao Roberto em sua reclamação e falar dos meus esforços dentro do governo para dar solução ao problema, convidei o Roberto a assumir a UNIVERDE, e reerguer a entidade, com a minha ajuda e total apoio. Tivemos algumas reuniões sobre o assunto até que ele aceitou, quando lhe passei todos os documentos da UNIVERDE em várias sacolas e caixas, e a ONG é uma organização atuante e combativa até hoje, em São Gonçalo. De garçom e líder comunitário, Roberto tornou-se num ambientalista guerreiro, estudou sobre meio ambiente e também filiou-se ao PV e chegou a presidir o IEF – Instituto Estadual de Florestas.

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