sexta-feira, 12 de março de 2010

Encontros e desencontros

Todo mundo aceita naturalmente que a matemática, por exemplo, de tão importante, deve ser aprendida na escola, com livros e cadernos sobre o assunto. Mas e o amor? Também é muito importante, mas ninguém nos ensina! Será que é porque acham que já nascemos sabendo amar? Se o amor é uma arte, como toda arte, ele exige teoria e prática. Em meus relacionamentos, aprendi sobre o amor que ele é importante para criar uma espécie de ponte entre diferentes personalidades. Para seduzir e manter o outro a quem amamos, precisamos aperfeiçoar o que há de melhor em nós, e não se consegue isso através da auto-anulação, mas do aperfeiçoamento de nossa própria individualidade.

"A glória da amizade não é a mão estendida, nem o sorriso carinhoso, nem mesmo a delícia da companhia. É a inspiração espiritual que vem quando você descobre que alguém acredita e confia em você" - Ralph Waldo Emerson


Também aprendi que não existe uma ‘pessoa certa para amar’. Sam Keen escreveu que "passamos a amar não quando encontramos uma pessoa perfeita, mas quando aprendemos a ver perfeitamente uma pessoa imperfeita". Príncipes encantados só existem em novelas e contos de fadas. Não existem seres humanos perfeitos. Assim como existem defeitos e virtudes em nós, também existem no outro a quem amamos. A fase de namoro, da paixão, permite-nos descobrir afinidades que farão valer a pena amar, investir no estabelecimento de vínculos permanentes, eterno enquanto dure, como escreveu nosso poeta Vinícius de Moraes.

Na fase de namoro, o jogo da sedução faz com que nos esforcemos para revelar ao outro o que temos de melhor em nós, mas é a convivência do dia-a-dia que nos irá revelar por inteiro. Não é possível representarmos um papel o tempo todo, só mostrando ao outro um lado de nós que julgamos mais bonito e melhor. Na fase da sedução exageramos nossos atributos, como um farol que lança luz sobre nossas virtudes e deixa os defeitos nas sombras. Neste sentido, o amor nos motiva, nos impulsiona a querer ser o melhor que pudermos. Por isso, amar é, sem dúvida, uma das experiências mais ricas que um ser humano pode ter.

Dificilmente nos apaixonamos pelos defeitos dos outros. Precisamos de sonho, de idealização, pois a realidade pode não ser suficientemente atraente e ao buscarmos um relacionamento queremos ser felizes, queremos viver uma situação que é diferente da situação real em que vivemos. Sem o romantismo, que idealiza o ser amado, talvez não tenhamos a energia e a disposição necessárias para romper com a inércia e então preferimos ficar sozinhos. Entretanto, romantismo demais pode atrapalhar, por exemplo, quando a pessoa idealiza com tão grande imaginação que se descola da realidade. Pessoas assim acabam se apaixonando pela idéia que fazem do outro e não pela pessoa de verdade. E é bem comum se decepcionarem quando, na convivência do dia-a-dia, se confrontam com o ser real. Pessoas românticas em excesso acham que o problema está nos outros, que não conseguem corresponder às suas idealizações.

“O amor começa quando uma pessoa se sente só e termina quando uma pessoa deseja estar só.” - Léon Tolstoi


Alguns defendem que o amor não acaba, mas se transforma, na melhor das hipóteses, em amizade, respeito, consideração, gratidão, amizade, ternura, afeto e, na pior, em indiferença, ódio, tédio, vazio, etc. Outros defendem que o amor acaba sim, como Felipe Machado, por que a vida é assim mesmo, imperfeita:

“Ao contrário do que dizem os poetas, amor acaba, sim. Não há nada de romântico nisso, apenas uma verdade pragmática e palpável. Quando o amor acaba, o monstro que estava escondido debaixo do tapete da sala acorda e domina rapidamente o apartamento. Frases que nunca deveriam ter sido sequer pensadas são pronunciadas com a determinação dos carrascos. Não se pode atravessar uma ponte que foi queimada; com as palavras acontece a mesma coisa. Agora os dois se olham e sabem que não têm mais o que fazer. Dentro deles há uma dor contínua, uma tristeza que sai pelos olhos. Os dois corações estão vazios, porque no lugar daquele amor todo agora não existe nada. E a vida segue assim, imperfeita.”


Entretanto, saber quando o amor acaba, ou se transforma em outra coisa, boa ou má, nunca é muito fácil, por que não é de uma hora para outra. O relacionamento começa a balançar entre bons e maus momentos, até que os maus momentos superam os bons, e aí os sinais vão ficando cada vez mais claros. Fica mais difícil ainda quando o amor acaba, se transforma, ou diminui para um, e o mesmo não ocorre com o outro.
Um dos sinais de que as coisas mudaram é quando não nos interessamos mais nem em contar sobre as novidades, e o que aconteceu em nosso dia a dia, e também não sentimos mais vontade em saber do outro, as novidades da vida dele. É um indicador de que você perdeu a vontade de compartilhar com o outro a sua vida, e que também não está mais interessado na vida do outro.

Outro sinal é quando a diversão acaba, e nem mesmo o lugar onde se está, que pode ser maravilhoso, é capaz de mudar a situação! Você não sente mais prazer em estar do lado do outro, não sente vontade de rir, de relaxar, se irrita por qualquer coisa, inicia ou dá força a brigas sem sentidos, que só servirão para afastar ainda mais o casal.

O sexo, geralmente confundido com amor, é usado como termômetro no relacionamento do casal, mas não deveria, pois sexo é uma necessidade física que pode continuar existindo mesmo depois que o relacionamento amoroso já acabou ou se transformou em outros sentimentos. Diferente de compartilhar com outro sua vida e experiências, uma necessidade espiritual. O sexo é importante num relacionamento amoroso e reforça os laços de intimidade e cumplicidade, mas não se deve exagerar o seu papel, pois diversos fatores podem influenciar na diminuição da libido que não necessariamente a falta de amor. Um simples estresse pode acabar com a vontade de fazer sexo, mesmo quando o casal está numa fase apaixonada! Por outro lado, existem pessoas que tem o sexo como vício, ou como profissão, é nem um caso nem o outro são indicativos de amor!

É deprimente e melancólico perceber que uma pessoa que você amou, com a qual conviveu e compartilhou tantos momentos, viagens, experiências, a criação dos filhos, já não o ama mais, ou que você já não a ama mais como antes. Você se sente impotente para mudar as coisas, por que não tem como mudar um sentimento. Amor, assim como a felicidade, não é algo que se compra na farmácia ou na prateleira do supermercado. Trata-se de um sentimento, e a gente não manda nos sentimentos. Podemos mudar a maneira de perceber as coisas, mudar a rotina, mudar as atitudes, mudar as palavras, mas se não houver mais amor, talvez seja tudo esforço inútil que apenas prolongará o sofrimento.

Se a primeira dificuldade é saber quando o amor acaba ou se transforma, a segunda é saber como acabar o relacionamento e, a terceira, é como superar o fim do relacionamento! Francesco Petrarca afirma que “as duas cartas de amor mais difíceis de escrever são a primeira e a última.” E William Shakespeare alerta que “guardar rancor é como beber veneno e ficar esperando que o outro morra”!

Hoje, procuro dar mais espaço para as minhas emoções sem precisar explicar tudo o que sinto, a não ser quando os sentimentos exigem uma explicação, pois o outro não tem de ser adivinho. Vivo um dia de cada vez, sem ansiedade pelo futuro que não domino nem sei como vai ser ou culpa por um passado que não posso mais mudar. Muito menos me sinto tão comprometido com o outro a ponto de valorizar mais os sentimentos do outro que os meus próprios sentimentos. Exercito diariamente ser mais flexível com o outro, pois são pessoas diferentes e o que deve importar não é o quanto um ou o outro tem razão, como se amar fosse uma competição para ver quem ganha, mas o quanto podemos ser felizes juntos. E, quando tenho de dizer o que o incomoda no outro, faço no momento oportuno e sempre com ternura e palavras mansas, pois o objetivo não é ter razão, mas manter a felicidade da relação. Confio na capacidade do outro em se proteger emocionalmente até mesmo de mim, afinal, quando um não quer dois não brigam - nem se amam. É um erro me fechar para novas possibilidades e insistir numa relação onde se esgotaram as chances de felicidade conjunta. Não me sinto tão responsável quando um relacionamento não dá certo, pois ninguém é obrigado a gostar de ninguém, e existem tantos nãos no mundo quantos sins.
“Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém... Posso apenas dar boas razões para que gostem de mim... E ter paciência para que a vida faça o resto...” - William Shakespeare
Entretanto, não existem pessoas perfeitas, relacionamentos perfeitos, família perfeita, muito menos as pessoas têm de ser como imaginamos ou queremos que sejam, e perdoá-las é uma forma de aproveitar o melhor delas e até reforçar laços de afeto, mesmo quando pensam ou agem diferente do que gostaríamos que agissem. Novamente lembro William Shakespeare:

“Depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença, entre dar a mão e acorrentar uma alma. E você aprende que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança. E começa a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas... E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la por isso... Aprende que não temos que mudar de amigos se compreendemos que os amigos mudam, percebe que seu melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos... Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração foi partido, o mundo não pára para que você o conserte. Aprende que o tempo não é algo que possa voltar para trás. Portanto, plante seu jardim e decore sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga flores. “


Gentileza gera gentileza”, escrevia pelos muros da cidade do Rio de Janeiro o Profeta Gentileza, um ‘maluco beleza’ dos tempos em que eu morava em São Gonçalo e trabalhava no Rio de Janeiro. Pela janela do ônibus era comum vê-lo pintando os muros! A mensagem é verdadeira, mas a visão é ingênua ao achar que a gentileza será capaz de tornar o mundo melhor! Lembro de políticos velhacos e corruptos que no Parlamento tratam-se uns aos outros com a maior gentileza, vossa excelência para cá e para lá, mas que na verdade são lobos em pele de cordeiro! Os estelionatários também usam da gentileza, da amizade, da beleza, da inteligência para nos conquistar e se aproximar de nós, para nos fim nos trair com seus golpes. Quando uma pessoa folgada e interesseira entra em nossa vida, por mais que você ame e seja generoso, isso não a transformará numa pessoa melhor, necessariamente. Pode torná-la ainda mais mesquinha e gananciosa. E quando você tentar se livrar ou exigir mudança vai descobrir o quanto uma pessoa assim pode ser manipuladora, pode explorar seus sentimentos de generosidade a ponto de fazê-lo se sentir culpado por cobrar mudanças, ou pode despertar um carrasco! Lembro dos inúmeros crimes passionais e também dos tristes casos de filhos e filhas que matam os pais e avós por que querem receber mais e mais! Em outubro de 2002, a estudante Suzane von Richthofen chocou o país ao confessar o assassinato dos pais enquanto eles dormiam em casa, no bairro do Brooklin, Zona Sul de São Paulo. O motivo do crime seria uma suposta oposição deles ao namoro de Suzane com Daniel Cravinhos, também envolvido nas mortes. Na mesma época, outro crime bárbaro perpetrado por um jovem de 17 anos que confessou ter matado a mãe estrangulada, afirmando que o crime ocorrera após uma discussão. Casos de violência extrema como esses mobilizam a sociedade não somente por sua natureza, mas também por refletir um desgaste nos relacionamentos familiares. Esta violência não aconteceu de uma hora para outra. Uma educação e sociedade permissivas, que cultivam o individualismo, o consumismo, a indiferença como valores, geram pessoas sem valor, sem personalidade, que acham que o mundo é como as novelas, que o padrão de vida não pode cair quando se tenta entrar no mercado de trabalho ou constituir família. O filho da família ou de uma sociedade permissiva não sabe como lidar com frustrações nem está acostumado à dificuldade e ao esforço, base da educação do caráter. O nível de violência nas ruas será menor à medida que cresça na sociedade o respeito mútuo - e este se aprende em família, com pais conscientes de que sua verdadeira missão no mundo é formar o caráter dos filhos. Claro, educar e pôr limites, exercer autoridade, dá trabalho, requer dedicação, exige de nós, por isso é um ato de amor e de doação, que nem todos os pais ou adultos estão dispostos a ter pelas crianças e jovens sob sua responsabilidade. Crescendo abandonados quase que à própria sorte, dependendo de babás despreparadas e da televisão como babá eletrônica, ou de esperança que a escola vá dar conta da tarefa de educar, não me surpreende o grau de violência e de infelicidade, e de depressão de nossa sociedade!

“O desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade”. - Carlos Drummond de Andrade


Tem gente que escolhe não amar para não sofrer, então prefere viver só, ou entra nas relações amorosas com um pé atrás, geralmente em função de decepções do passado. E depois se surpreende por que ‘nunca dá certo’! O medo paralisa, mas a vida é risco! “A vida é maravilhosa se não se tem medo dela” disse Charles Chaplin. Não tenho medo de correr riscos ou de sofrer. Entretanto, também não sou mais tão ingênuo e assim que percebo algum folgado tentando se aproveitar de mim, não tenho a menor dificuldade em estabelecer claramente os limites! É uma forma de protegê-las delas mesmas para que não façam estragos que venham a se lamentar mais tarde, por que ninguém que parasita outra consegue ser feliz muito menos fazer o outro feliz e não estarei ajudando as pessoas a escolherem por si próprias e serem pessoas autônomas, uteis a si próprias e à sociedade, permitindo que me parasitem de alguma maneira!

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